sábado, 22 de outubro de 2011

Pior que a Morte - Frederico Barbosa

*pic: Oliviero Toscani, em sua publicidade engajada
em United Colors of Bennetton. 

para JC

O pior é o que dizem: rezou.

Ele que sempre foi contra,
do contra, ateu,
agora que zerou, creu?

Ele que sabia que a vida é coisa
de sempre não
Sem fórmulas fáceis,
nem saídas para a dor
de cabeça
de pensar
de ser sem crer.

Ele sabia que não há aspirina
contra o bolor.

Logo dirão que se inspirou,
e compôs de improviso
um soneto vendido,
dos que sempre enfrentou.

Dirão ainda que se converteu
e defendeu a vida devota,
a pacificação bovina,
a prédica dos pastores.

                (Verbo e verba:
                  pragas velhas.)

E que se arrependeu do pecado
de ser exato, claro e enjoado.

Vida, te escrevo merda.
Às vezes fezes, mas sempre merda.

Fingida flor, feliz cogumelo,
caga e mela.
Sempre severa e cega merda.

Triste é depender
de relatos carolas,
acadêmicos, cartolas.

Triste é depender
da leitura alheia,
facéis falácias: farsas.

Triste é depender
dos olhos dos outros,
de voz de falsas sereias.

Triste é não poder mais
se defender.

Mas
um aqui, João,
incerto, grita
e insiste em não crer
na sua crença repentina
que a morte (sua)
 desminta a obra (sua) vida

                     Um aqui, João
                     o tem por certo:
                     é mais difícil o não
                     crer, não
                     ceder, não
                     descer, não
                     conceder: Não

                     Não, não orou.


*o pior é quando morto te inutilizarem a VIDA

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