terça-feira, 27 de setembro de 2011

Grupo LESMA lança seu segundo CD Árvore da Vida



Imagem da capa do CD com desenho de Carolina Nogueira


“E o Senhor colocou, ao oriente do jardim do Éden, querubins armados com uma espada flamejante para guardar o caminho da árvore da vida”.
(Gênesis 3:24)


Depois de 5 anos o Grupo Lesma lança seu segundo CD. Intitulado “Árvore da Vida”, a obra tem enfoque ambiental e reúne poemas e músicas autorais. O CD foi gravado no estúdio SELF, em Lafaiete, entre os meses de julho e setembro e o lançamento está marcado para o dia 30 deste mês no Sallum, em Lafaiete, dentro da programação do Setembro Verde, realizado pela Lesma.
Vários artistas convergiram energia e criatividade em torno da proposta. A direção musical é do competente compositor Wilson Ribeiro, o “Ziquinha”. Leo Fernandes assina a direção de áudio. Os poetas participantes são Osmir Camilo, Patrícia Fonseca e Wagner Vieira. O músico Gastão Mandredinni, da banda Lord Zéfiro, de Queluzito, também participa do projeto. Os músicos convidados são Julinho do Sax, Márcio Zaum e Sandro Leyloy.
Um livro contendo as letras e os poemas, acompanha o CD, que conta com desenhos da artista plástica Carolina Nogueira e fotos de Jonathan Manassés. Marco Aurélio Lopes Correia assina a diagramação.
Conselheiro
Em 2006 o Lesma lançou seu primeiro trabalho sonoro, o CD “Conselheiro”. De lá para cá a produção editorial da entidade chega a 11 títulos, com destaque para os livros “O Amor Visto da Ponte”, de Wagner Vieira, Patrícia Fonseca e Osmir Camilo; “Lafayette Rodrigues Pereira, um ilustre queluzense”, de Allex Milagre (1971-2009) e “De Villa Real de Queluz a Conselheiro Lafaiete”, do museólogo Antônio Perdigão (1918-2010).
Serviço



O que: CD Árvore da Vida
Quando: 30 de setembro de 2011
Onde: Bar Sallum (r. Coronel Arthur Nascimento, nº 105, Centro, Conselheiro Lafaiete)

Contatos: (31) 8584-5056 / 8591-1622

E-mail: abrilpoetico@yahoo.com.br

Leonardo, Osmir e Wilson (em pé); Gastão, Wagner e Patrícia (sentados)




UM POEMA DO CD

Árvore da vida

1
Árvores da vida são aquelas cujos
galhos são capazes de ampliar (bem)
fronteiras em searas reluzentes
e gongóricas.
Árvore da vida. Única.
vocação solitária pelo consorte do eixo oriental
Tu és mater (mãe). Athos flexível.

2
Ó árvore flexível, seminal das horas
Pantera postergada no embrião das almas
Conduz pela ardência dos corpos indefesos
A côrte ostensiva aos pêlos agrupados.

Purificai! Purificai! Purificai!

Conselheiro Queliname: iara
Queliname Conselheiro: jaguara
Trazendo luz pacífica ao parque dos sinais
fazendo diapasão com foros ancestrais.

3
Árvore da vida. Árvore da vida.
Árvore dá vida. Árvore dá vida.
Inteiramente grátis.

vendo-me vendo-me vendo-me

Escuto teu nome em voz
escuta a minha
Escuta meu pedido em off
Vontade sua. desejo meu. bondade sua.

4
São pomares, hortas silvestres,
animais domésticos.

Um pomar. Único.
Saibamos antes que o pomar dos sonhos
ainda está verde, verdejante.
Caindo de maduro no céu com diamantes.
Trançando estrelas no véu das ilusões.
As ilusões.

Poema: Osmir Camilo

sábado, 24 de setembro de 2011

Lá no palácio das Abelhas a menina dizia ao ouvido da boneca: "'eu' para mim é pouco"

...lá no palácio das Abelhas a menina dizia ao ouvido da boneca:

-Já reparou, Emília, como é bem arrumado esse reino? Uma verdadeira maravilha de ordem, economia e inteligência! Estive no quarto das crianças. Que gracinha! Cada qual no seu berço de cera, com pernas e braços cruzados, todas tão alvas, dormindo naquele sono gostoso... O que admiro é como as abelhas sabem aproveitar o espaço. Como sabem economizar a cera, tudo dispondo de modo que a colmeia funcione como se fosse um relógio. Ah, se o nosso reino também fosse assim... Aqui não há pobres nem ricos. Não se vê um aleijado, um cego, um tuberculoso. Todos trabalham, felizes e contentes.
— Isso não! — contestou a boneca. — O besouro é aleijado e pede esmolas.
— Besouro não é abelha, boba. Estou falando das abelhas.
— E quem manda aqui? Quem é o delegado? – perguntou Emília.
— Ninguém manda — e é isso o mais curioso. — Ninguém manda e todos obedecem.
— Não pode ser! — exclamou a boneca. — Quem manda há de ser a rainha. Vou perguntar. e chamou uma abelha que ia passando.
— Faça o favor, senhora abelhinha, de nos dar uma informação. Quem é, afinal de contas, que manda neste reino? A rainha?”
— Não senhora! — respondeu a abelha. — Nós não temos governo, porque não precisamos de governo. Cada qual nasce com o governo dentro de si, sabendo perfeitamente o que deve e o que não deve fazer.
Nesse ponto somos perfeitas.
Narizinho ficou admirada daquelas idéias, e viu que era assim mesmo. “Que pena que também não seja assim na humanidade!”
— De manhã saímos todas — continuou a abelha — cada uma para o seu lado, a fim de recolher o mel das flores e o pólen. É disso que nos alimentamos. Depois guardamos o mel nos favos. Se há consertos a fazer, qualquer uma de nós os faz sem que seja preciso ordem.
As Reinações de Narizinho - Monteiro Lobato

E sinto - 'eu' para mim é pouco.
Vladimir Maiakovski

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

¿Qué pasaría si la noche impone su gobierno de oscuridad a las estrellas?

Recusa

Agrada-me bem mais
olhar estrelas
do que assinar sentenças
de morte.
Agrada-me bem mais
ouvir a voz das flores
que, murmurando é ele,
meneiam as corolas
quando eu cruzo o jardim
do que ver os escuros
fuzis da guarda
matarem quantos querem
matar-me –
por isso eu não serei
– jamais – um governante.

Velimir Khliebnikov


Hoy haz despertado del sueño de la pacividad
Esto no te gusta y lo tienes ke kambiar
La miseria del sistema
La injusticia del sistema

Seremos ingobernables , seremos ingobernables

Cuelga sabotaje manifestacion
Las palabras son importantes pero lo es tambien la accion
Estudiar y lucha siempre apartes por igual
Piensa friamente kuando tengas que actuar

Seremos ingobernables , seremos ingobernables

Tu inteligencia es el arma mas valiosa
Tu energia kontra el estado de las kosas

Seremos ingobernables , seremos ingobernables

Sin Dios

Pelo direito à educação pública de qualidade

Contra a falsa democracia fascista, controlada e corrupta

Caminhamos

de

olho
e
mãos
na
estrela
do

amanhã

Link para o brilhante texto "Os professores não usam black tie" de Luiz Felipe Martins Candido, sobre o movimento grevista em prol da valorização da educação em Minas Gerais.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Anderson Souza e o delírio da simplicidade hiperbólica

Aproveitando o natalício do poeta Anderson de Souza, conhecido nos já velhos tempos da mais velha ainda São João del-Rei, o grupo Larvas tem o prazer de homenagear (nos) com uma palinha desse grande ser humano, filósofo e escritor, que ainda divaga -corajosamente- como educador nas horas vagas, e também é tantas outras coisas em tantos outros lugares desse mundão de ninguém.


São João del-Rei


Há certos cordões que, quando arrebentados, causam uma dor terrível.
Depois que o cordão umbilical que me unia à minha mãe se arrebentou,
fui construindo novos outros – com meu amor, meu entusiasmo, minhas quedas, meus sonhos...
Mas que logo, novamente se arrebentavam...
Em São João del-Rei, não foi diferente!
O cordão que se formou entre eu e esta cidade foi tão intenso, mas tão intenso... (aos meus sentidos e a minha irracional razão),
que quando me assustei, uma parte de mim já havia se dissolvido
no último crepúsculo do meu olhar junto à igreja São Francisco.
Parece uma hipérbole! E é mesmo! É também um exagero
dizer que São João não é mais o sonho, não é mais a minha realidade.
Não é mais minha vida, não é mais minha cidade/mãe?!
...ah – o teatro, as orquestras, os amigos, a Karen, a Marina, a Suleimara, a Marcelinha, (os amores), os conflitos, as brigas, os margumes, o Naldinho, o Anselmo, o Josias, o Monteiro, o Aluízio, o chá mágico, a Camila, as crises, as alegrias, as loucuras, a Gisele, as vielas, as luas, as pontes, as festas, a faculdade, as vertentes, os recitais... tudo, hoje...é apenas uma ideia – sem encosto e sem acento – pendurada em um cordão arrebentado de minhas lembranças.


...


“Personalidade é tudo na arte e na poesia.”
(Goethe)


Felicito-me com a alegria da alma dos pássaros.
Mas, a alma, o que é?...
(Os filósofos vão dizer que é uma determinada substância.
Os físicos vão dizer que é uma espécie de energia.
Os “espíritas”, a seu modo, vão dizer outra coisa...). Alice, por sua vez, disse-me que mostro minha alma ao escrever poemas. Então vá:
alma abstrata diante dos pilares de concreto do tempo;
Vá – idéia desconexa com a lógica do mundo;
Vá – algarismo perdido no Um de Pitágoras;
Vá – linguagem figurada diante das figuras terrestres;
Vá – comboio de fantasias desnorteadas;
Vá – ilusão de uma das fatias do espaço;
Vá – rima metafísica aos olhos do alfabeto do mundo;
Vá – corda arrebentada de uma canção crepuscular;
Vá – devaneio inconsciente dos sonhos mortos de Freud;
Vá – imagem perdida nas margens da vida;
Vá – metáfora sem sentido da nova ortografia;
Vá...
Mesmo que inconstante, mesmo que cambaleante, mesmo que inconsciente, mesmo que impertinente, mesmo que em forma de letras mal traçadas e mal estruturadas; vá, mesmo que distorcida,
mesmo que reprimida, mesmo que perdida, mesmo que sem sina, mesmo que sem rima, mesmo que rouca, mesmo que louca... Vá...
Vá ao encontro de olhos espirituosos que possam abraçar tua angústia, que possam abraçar teu sorriso, que possam abraçar tuas alegrias, tristezas e imperfeições. Vá, siga os sinais!... Continue ouvindo os pássaros e as palavras de Alice. E, se Apolo lhe permitir, diga a ela que seu espírito é um presente sem roupas para cobrir (tua alma).


* Anderson, Poeta, de mão e garganta cheia, sabe dizer seus versos em alto e bom som como poucos. Acaba de lançar seu segundo livro de poemas "Fragmentos do Inconsciente e Outros Poemas". Há quem diga que o viu com seu filho no colo em SP, e na lua. Há quem diga que o viu tomando uma cachaça em Macuco ou no bar do Bosco. O certo é que, onde quer que ele passe, fica um rastro cinza de explosão e melancolia.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Mais uma re volta ao maior ataque terrorista de todos os tempos

‎11 de setembro.
Triste aniversário de um dos maiores ataques TERRORISTAS da história: o bombardeio e invasão dos EUA no "Palacio de la Moneda", seguido pelo assasinato do presidente Salvador Allende e 30 anos de uma das ditaduras fascitas mais sangrentas da história, liderada pelo general Pinochet. Palavras do último discurso de Allende, disponível no you tube:


El pueblo debe defenderse, pero no sacrificarse. El pueblo no debe dejarse arrasar ni acribillar, pero tampoco puede humillarse.
Trabajadores de mi Patria, tengo fe en Chile y su destino. Superarán otros hombres este momento gris y amargo ...
en el que la traición pretende imponerse. Sigan ustedes sabiendo que, mucho más temprano que tarde, de nuevo se abrirán las grandes alamedas por donde pase el hombre libre, para construir una sociedad mejor.

¡Viva Chile! ¡Viva el pueblo! ¡Vivan los trabajadores!

Estas son mis últimas palabras y tengo la certeza de que mi sacrificio no será en vano, tengo la certeza de que, por lo menos, será una lección moral que castigará la felonía, la cobardía y la traición.



Segue um dos curtas de um filme que reúne 11 diretores para exporem suas obras sobre os atentados dos EUA nas torres gêmeas, sob a perspectiva que melhor lhes parecesse. Esse, talvez seja o melhor:



Aproveitando a oportunidade para expressar todo nosso apoio aos estudantes em luta no Chile e aos professores de Minas Gerais. Que bom seria ter uma entidade estudantil em nível nacional que ajudasse a mobilizar e politizar nossa juventude - universitária ou não - ao invés de trocar seu silêncio por favores governamentais.



"A esperança tem duas filhas lindas: a indignação e a coragem; a indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las." - Santo Agostinho

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

O blog "Larvas Poesia" ia fazer uma postagem especial e revoltada sobre o 11 de setembro, mas tava tão distraido que não viu que passou - Laerte

*Sobre o que mesmo que você estava falando?

In ventos de Raisa Faetti: poesia pintada, poemada, verdirevificada.

Sul de Minas
Me importa apenas que não seja
essa simplicidade um esconderijo das vontades
Que não seja a humildade
o refúgio das verdades e das vaidades

Os campos verdejantes
os lírios perfumados
a pequena casa distante
isso é natureza morta
é homem morto

Admitamos
Inventando, Raisa Faetti


Aleluias
Uma revoada de pensamentos assaltou minha cabeça
Do mesmo modo que um enxame de aleluias brincam na luz da tarde
vivas, efêmeras e contagiantes

No outro dia, a visão chocante:
Asas quebradas por todo o quintal.


 
**Raisa Faetti é poeta de mão cheia. Cheia de doçura, plantas e planos planando entre o desenho e a letra, a brisa e a crítica, os sons e os sentidos, o sol e a raiz. Mais de seus escritos podem ser encontrados no sítio desenraisando .

sábado, 10 de setembro de 2011

Saltando grades - Vinicius Tobias

A palavra grade

a idéia em geral é passar além até mesmo do que pode ser além
extra-além é uma palavra que se deve fixar, quando o além não bastar
mas se todas as idéias são grades, pra construir a cadeia
agente larga de viadagem e se fixa na palavra grade
agente senta na palavra grade
escala a palavra grade
emudece na palavra grade
e enfurece na palavra grade
encontramos a mais profunda  paz que se pode conceber
na palavra ingênua e se canta dois tons de céu azul por hora
agente senta no meio da cadeia e grita AH!
ri que nem bobo da palavra grade, aí perde o equilíbrio e quebra os dentes
agente fica imbecil e descontextualizado na palavra grade
e de repente a palavra grade é tudo pra gente
e de repente a grade existe
e a cadeia
mas agente se desespera e chora pacaralho na palavra grade
agente manda a grade tomar no cu e mostra o cu pra palavra grade
e a palavrade só nos oprime mais
aí numa idéia genial agente masca ela que nem chiclete e cospe tudo melado pingando

aí virou grude

aí agente larga de viadagem e  se fixa na palavra grude


*-Professor, estou realmente maravilhado, nunca pensei que veria a divisa do universo.... Mas o que são aquelas coisas?
-Aqueles somos nós, no final oposto do universo paralelo, pensando, fazendo e falando o mesmo que nós, só que ao contrário. (Dialogo de Futurama) 

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Mariposas e Borboletas - Karol Penido

A luz esboçada na parede
enquanto as pessoas caminham sob a claridade dos postes nas calçadas
Um encanto:
a sombra dos meus sapatos
ao tocarem a luz
dissipam-se em buracos negros
crianças descem nas estações de metrô
apoiadas nos ombros dos pais
Nos olhos fechados:
asas de borboletas
Enquanto mariposas sobrevoam meus dedos dos pés
querem me seduzir
para mais um passeio.
 
                                             *quero salvar o homem utilizando borboletas (Manoel de Barros)
 

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Como amo o meu país - Affonso Romano de Sant'ana

1
Com aquela melancolia que ao entardecer
                                                             em Teresina
eu olhava do outro lado do sujo rio
                                                 a vilazinha de Timon,
com a fúria da multidão endomingada martelando caranguejos
entre farofa e cerveja
                              numa praia em Aracaju,
com a penitência de quem amassa o barro
que depois vira anjo nas mãos de mulheres de Tracunhaém,
com a sordidez marinha do jangadeiro
                                                       em Cabedelo
empurrando a esperança mar adentro
e a repartir a espinha do dia morto sobre a areia,
com a cadência magoada do vaqueiro tangido nos seus cornos
a recolher o sal e a solidão
                             nos currais de Minas, em Curvelo,
assim
          eu amo este país que me desama.
2
Deveria deixar de amá-lo como sub ser vivo
                                  e amá-lo ostensivo
                                  num tropel de bandeiras
                                  num estádio de urros
                                  e canções guerreiras?
Amo este país
                      como o hortelão cuida e corta
a praga de sua horta
                e parte com seu cesto a bater de porta em porta,
com a resignação do operário
                       abraçado à neblina da marmita,
quando larga os panos e a mulher na madrugada
e sai do café quente de sua casa
e desce nos vagões de medo ao fundo da espúria mina.
3
Deve haver quem ame o seu país
                                 como quem escarra em casa própria,
                                 coça o saco na calçada,
                                 arrota e palita os dentes,
                                 entorna cachaça ao santo
                                 suando a alma e o corpo
                                 no ébrio espasmo do gol.
Uns amam seu país
como o mendigo o seu muro,
como o agiota o seu juro.
Outros
         como o domador às suas feras:
                                                  — distância e precisão —
         para evitar que o povo
                                   — lhe arranque o poder da mão.
Outros amam seu país
como o carcereiro à prisão,
o lenhador a floresta
e o carvoeiro o carvão.
Há quem ame no palco e pista
sem máscaras, expondo as vísceras,
e há quem o ame sonolento
num camarote ou nas frisas 
enquanto o cantor, o cavalo e o jogador
se atropelam numa ópera surrealista.
Há quem o ame com o cáustico e sádico amor
com que o gigolô deprava e surra a cansada mulher das madrugadas
ou quem o ame 
                        como a própria mulher
                                    furando seus cartões ao som do sexo
                                    aviltado no metal da orquestra.
4
Eu, quando posso, 
                            ponho minha alma num carro de bebê 
                            e vou levá-la ao sol da praça. Praça
                            que ninguém mais conheceu
                            que Felipe dos Santos atado
                            à cauda do cavalo, cimentando o chão
                            com o repasto de seu sangue.
Fora isto
             com a passividade estrangulada do índio
             carregando as armas do invasor
tenho a ingenuidade e os desperdiçado amor
dos Kreen-Akarores em suas matas
quando viram os berloques e espelhos
                                                        trazidos
pelos irmãos Vilas-Boas
                                    do outro lado do rio.
Desde então
eu amo este país
                       — como a prostituta ama a estrada.
*e você como ama seu país?

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Saltos do Samurai Malandro ou Chuvas do Cachorro Louco ou o Bandido que Sabia Latim

O Brasil tem muitas coisas, apesar de tudo. Tem um extenso território, apesar de tudo. Fala só uma língua, apesar de tudo. Tem uma grande diversidade cultural, apesar de tudo. Tem muitas riquezas, apesar de tudo. Tem grandes artistas, apesar de tudo. Se diz até que é um país feliz, apesar de tudo.

E apesar de tudo, e esse tudo tem tanta coisa nele, o Brasil tem grandes poetas, e não só aquela grandeza nobre, de coroa e cadeira, de academia, de letras.

Eu digo de poesia, essa que tem de se deixar debaixo da língua até dissolver na vida.
Essa, a linguadem da paixão, ou a paixão da linguagem, como num ensaio de Leminski.
Desses sujeitos que se bobear, fazem chover no nosso pequenique.

Que querem ser exatamente aquilo que são: o além.



Foi seu aniversário semana passada, e aniversário é isso: desculpa. Chegamos atrasados, como se andássemos mais adiante. E já que o porraloca nos fez o desfavor de dar a moeda pro barqueiro antes do tempo, e sempre seria antes, nós vamos por aqui, por aí, sentindo o gosto da sua língua do tamanho do caminho de curitiba até o japão e do japão até o seu céu o lá o léu o vil véu que nos separa de todo esse nada:

INVERNÁCULO

    Esta língua não é minha,
qualquer um percebe.
    Quem sabe maldigo mentiras,
vai ver que só minto verdades.
    Assim me falo, eu, mínima,
quem sabe, eu sinto, mal sabe.
    Esta não é minha língua.
A língua que eu falo trava
    uma canção longínqua,
a voz, além, nem palavra.
    O dialeto que se usa
à margem esquerda da frase,
    eis a fala que me lusa,
eu, meio, eu dentro, eu, quase.

...


   nunca sei ao certo
se sou um menino de dúvidas
    ou um homem de fé

    certezas o vento leva
só dúvidas ficam de pé

...


leite, leitura,
letras, literatura,
    tudo o que passa,
tudo o que dura
    tudo o que duramente passa
tudo o que passageiramente dura
    tudo, tudo, tudo,
não passa de caricatura
    de você, minha amargura
de ver que viver não tem cura

...

desastre de uma idéia
só o durante dura
    aquilo que o dia adiante adia

    estranhas formas assume a vida
quando eu como tudo que me convida
    e coisa alguma me sacia

    formas estranhas assume a fome
quando o dia é desordem
    e meu sonho dorme

    fome da china   fome da índia
fome que ainda não tomou cor
    essa fúria que quer
                            seja lá o que for

...


 ERRA UMA VEZ


           nunca cometo o mesmo erro
        duas vezes
           já cometo duas três
        quatro cinco seis
           até esse erro aprender
        que só o erro tem vez

...


 °

     eu ontem tive a impressão
que deus quis falar comigo
     não lhe dei ouvidos

     quem sou eu pra falar com deus?
ele que cuide dos seus assuntos
     eu cuido dos meus
...


ICEBERG


    Uma poesia ártica,
claro, é isso que eu desejo.
    Uma prática pálida,
três versos de gelo.
    Uma frase-superfície
onde vida-frase alguma
    não seja mais possível.
Frase, não, Nenhuma.
    Uma lira nula,
reduzida ao puro mínimo,
    um piscar do espírito,
a única coisa única.
    Mas falo. E, ao falar, provoco
nuvens de equívocos
    (ou enxame de monólogos?)
Sim, inverno, estamos vivos.
...


III


Esse estranho hábito
escrever obras-primas,
não me veio rápido.
Custou-me rimas.
Umas paguei caro,
liras, vidas, preços máximos.
Umas, foi fácil.
Outras, nem falo.
Me lembro duma
que desfiz a socos.
Duas, em suma.
Bati mais um pouco.
Esse estranho abuso,
adquiri faz séculos.
Aos outros, as músicas.
Eu, senhor, sou todo ecos.

...



Não, não cansa. Des cansa. A vista o ouvido a mente o coração.
E não vai ser eu quem vai dizer esse sim, esse não, deixa Àlice, que sabe o que diz:

Esses poemas, mais que quaisquer outros,
estão cheios de noites e madrugadas adentro.
Cheios de uma dor tão elevada
que é capaz de nos fazer rir, apesador de tudo.
Cheios de dias na vida de uma luz.
São poemas de vitalidade, apesar do adeus...

Ruiz

No começo do ano em plena mostra de cinema em tiradentes, entre um filme um vinho e um paralelepípedo, deparei-me com o Ex-isto, que eu recomendo para todos que queiram apagar-se diluir-se desmanchar-se até que de mim de nós de tudo não reste mais que o charme:

 

E é o mesmo pessoal que fez o tão esperado documentário sobre o itamar assumpção.
Falo mais nada, falaí:

Moinho de versos
Movido a vento
Em noites de boemia

Vai vir o dia
Quando tudo que eu diga
Seja poesia

Pra terminar, um presente pra gente: o Bandido que Sabia Latim , com músicas feitas pelo cara que tem o bigode mais style que o nietzche. Fica aqui um convite pra quem quiser se debruçar, como catatau, nas águas da desrazão.

Vai me olhar com outros olhos ou com os olhos dos outros?

vida e morte
amor e dúvida
      dor e sorte

      quem for louco
que volte

    Ainda em tempo, um documentário pequeno sobre ele, bom demais, ótimos depoimentos.
    De quem sabe o que está fazendo, vivendo, inscrevendo. 
    Paulo Leminski - Ervilha da Fantasia (1985):

domingo, 4 de setembro de 2011

Sobre a indústria do antissemitismo e a manufatura da revolução cotidiana

Me deparei em outra dessas tardes quentes do méxico, com um documentário sobre a questão do "antissemitismo" hoje, nos EUA, em Israel e no mundo. Pra quem, como eu, não está familiarizado com o termo, pode-se entender que é, basicamente, uma homofobia contra judeus. Para nós brasileiros mineiros estudantes desinteressados poetas fudidos revolucionários de facebook etc.. parece estranho falar em judaísmo e intolerância etc.. parece aula de história, coisa de filme (e cada filme e novela que tem na "vida real"):



Realmente, não vejo no Brasil esse tipo de debate. Mas vejo o mesmo germe ideológico, o mesmo vírus memético sendo repetidamente propagado em diversas questões que tem sido debatidas por aí, cada vez mais, especialmente no que tange aos direitos dos homossexuais, negros, mulheres, indígenas, sem terra e a grande massa das ditas "minorias" das terras auriverdes e mundias.

Esse vídeo fala sobre a apropriação de um passado catástrófico para a perpetuação de toda uma milionária fábrica de dinheiro, e ainda, a manutenção de novos genocídios e invasões muito discutíveis como a questão que envolve o estado de israel x palestina.

Isso me lembra, inclusive, debates sobre a ditadura militar, a dilma, o serra, alguns conselheiros da UFSJ e todos que sofreram na mão da ditadura ou lutaram pelas "diretas já". Nós temos que respeitar o sofrimento do passado, aprender com ele, lutar contra a possibilidade de novas catástrofes sociais. Isso me remete a um texto que li antes de ver o vídeo, uma entrevista com o filósofo Slavoj Zikek, onde ele diz:

"Então concordo que há um perigo das ideias, mas acho que o dia seguinte é a parte mais importante das revoluções. Não me sinto fascinado por esses momentos de grande mobilização onde todos estão nas ruas, juntos, pedindo mudança. Isso sempre me lembra da França, onde todo conservador hoje, a começa por Sarzoky, diz: “claro, em 1968 eu estive nas barricadas”. O que me interessa é o dia seguinte."

Não tenho que falar muito pra gente fazer o paralelo Brasil x Ditadura - França x maio de 68 - Israel x Holocausto - Poetas e Músicos Revolucionários e Criativos x Ostracismos Criativo e Autovenda à Grandes Editoras e Gravadoras - "Diretas já" pós ditadura x "Diretas já" na UFSJ etc..

Simpatizei com o rapaz que fez o documentário. Conseguiu unir bem os pontos, mostrar - não com uma pretensa imparcialidade - as muitas faces de mais uma, das muitas, "indústrias" do medo, do terror.

Eu não tenho conhecimento profundo nesse assunto, mas pra mim ficou claro como a questão da intolerância é revisitada, apropriada, acoplada, utilizada, explorada de diversas formas em diversos lugares, sob distintas máscaras, argumentos, justificativas.

Gostei do final, ele dizendo em se olhar pra frente, numa imagem de estrada, caminho, e depois céu rubro de um crepúsculo para além das grades do campo de extermínio.

Coisas como essa me impulsionam a estar firme num pensamento que a nossa luta enquanto educadores, pensadores, artistas, cidadãos, acadêmicos - pessoas, enfim - está alicerçada num caminho que vai ao encontro de uma cultura que saiba entender diferenças. Aceitá-las. Conviver com elas.  Reconhecer a Alteridade, o Outro. Olhar para o passado para compreender e evitar catástrofes, e não justificar e germinar mais ideologias segregadoras.

E isso é menos uma postura clichê, cristã, moralista; que uma maneira de caminhar no sentido de novas possibilidades de aldeia e de mundo. Principalmente, uma maneira de olhar nos olhos da esfinge dos nossos tempos, e evitar a nossa destruição, que, como vemos, não deixa de nos rondar...


Pra não dizer que aqui não somos legalistas e constitucionais, vai aí uma proposta estatutária do nosso Tiago de Melo, que sempre primou pela raiz para sustentar a água, a brisa, a sombra, a manhã, o amanhã:
(poesia?)


 ESTATUTO DO HOMEM
   (Ato Institucional Permanente)

  Artigo I
 
   Fica decretado que agora vale a verdade.
   agora vale a vida,
   e de mãos dadas,
   marcharemos todos pela vida verdadeira.
 
 
   Artigo II
 
   Fica decretado que todos os dias da semana,
   inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
   têm direito a converter-se em manhãs de domingo.
 
 
   Artigo III
 
   Fica decretado que, a partir deste instante,
   haverá girassóis em todas as janelas,
   que os girassóis terão direito
   a abrir-se dentro da sombra;
   e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
   abertas para o verde onde cresce a esperança.
 
 
   Artigo IV
 
   Fica decretado que o homem
   não precisará nunca mais
   duvidar do homem.
   Que o homem confiará no homem
   como a palmeira confia no vento,
   como o vento confia no ar,
   como o ar confia no campo azul do céu.

 
           Parágrafo único:
 
           O homem, confiará no homem
           como um menino confia em outro menino.
 
 
   Artigo V
 
   Fica decretado que os homens
   estão livres do jugo da mentira.
   Nunca mais será preciso usar
   a couraça do silêncio
   nem a armadura de palavras.
   O homem se sentará à mesa
   com seu olhar limpo
   porque a verdade passará a ser servida
   antes da sobremesa.
 
 
   Artigo VI
 
   Fica estabelecida, durante dez séculos,
   a prática sonhada pelo profeta Isaías,
   e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
   e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.
 
 
   Artigo VII

   Por decreto irrevogável fica estabelecido
   o reinado permanente da justiça e da claridade,
   e a alegria será uma bandeira generosa
   para sempre desfraldada na alma do povo.
 
 
   Artigo VIII
 
   Fica decretado que a maior dor
   sempre foi e será sempre
   não poder dar-se amor a quem se ama
   e saber que é a água
   que dá à planta o milagre da flor.
 
 
   Artigo IX

   Fica permitido que o pão de cada dia
   tenha no homem o sinal de seu suor.
   Mas que sobretudo tenha
   sempre o quente sabor da ternura.
 
 
   Artigo X

   Fica permitido a qualquer pessoa,
   qualquer hora da vida,
   o uso do traje branco.
 
 
   Artigo XI
 
   Fica decretado, por definição,
   que o homem é um animal que ama
   e que por isso é belo,
   muito mais belo que a estrela da manhã.
 
 
   Artigo XII
 
   Decreta-se que nada será obrigado
   nem proibido,
   tudo será permitido,
   inclusive brincar com os rinocerontes
   e caminhar pelas tardes
   com uma imensa begônia na lapela.

 
           Parágrafo único:
 
           Só uma coisa fica proibida:
           amar sem amor.
 
 
   Artigo XIII
 
   Fica decretado que o dinheiro
   não poderá nunca mais comprar
   o sol das manhãs vindouras.
   Expulso do grande baú do medo,
   o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
   para defender o direito de cantar
   e a festa do dia que chegou.
 
 
   Artigo Final.
 
   Fica proibido o uso da palavra liberdade,
   a qual será suprimida dos dicionários
   e do pântano enganoso das bocas.
   A partir deste instante
   a liberdade será algo vivo e transparente
   como um fogo ou um rio,
   e a sua morada será sempre
   o coração do homem.






 
  Thiago de Mello
Santiago do Chile, abril de 1964
 


Agradeço a Luiz Felipe Martins Candido pela indicação.





quinta-feira, 1 de setembro de 2011

No way out - Robert Crumb

*"Não há saidas, só ruas, viadutos e avenidas (Itamar Assumpção)"
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