segunda-feira, 21 de setembro de 2020

As treze dicas (lunáticas) de Walter Benjamin a escritores.


 É proibido afixar cartazes


A técnica do escritor em treze teses


I. Quem quiser lançar-se a escrever uma obra de fôlego, instale-se comodamente e conceda a si próprio ao fim de cada dia de trabalho tudo aquilo que não prejudique a sua continuação.

II. Fale do que escreveu, se quiser, mas não leia nada a nínguem enquanto o trabalho estiver em curso. Toda a satisfação que daí possa retirar retardará o seu ritmo. Seguindo esse regime, o desejo crescente de comunicação acabará por ser um estímulo à conclusão.

III. Quanto às condições de trabalho, procure fugir à mediocridade da vida quotidiana. O meio sossego, acompanhado de ruídos pouco estimulantes, é degradante. Já o ruído de fundo de um estudo musical ou da confusão de vozes pode ser tão importante para o trabalho quanto o silêncio tangível da noite. Se este afina o ouvido interior, aqueles se tornam pedra de toque de uma dicção cuja riqueza consegue absorver em si até esses ruídos excêntricos.

IV. Evite servir-se o primeiro instrumento de trabalho que tenha à mão. É útil o apego pedante a determinados tipos de papel, canetas, tintas. Sem luxos, mas com a indispensável abundância desses utensílios.

V. Não deixe que nenhum pensamento passe por você incógnito, e use seu bloco de notas com o mesmo rigor com que os servições oficiais fazem o registro dos estrangeiros.

VI. Torne a sua caneta avessa à inspiração, e ela a atrairá a si com a força de um ímã. Quanto mais refletir antes de passar a escrito uma intuição, tanto mais amadurecida ela se te oferecerá. A fala conquista o pensamento, mas a escrita domina-o.

VII. Nunca deixe de escrever pelo fato de não o ocorrer mais nada. Um dos mandamentos da honra literária é o de interromper a escrita apenas quando há que respeitar uma hora marcada (uma refeição, um encontro) ou quando damos o trabalho por terminado.

VIII. Preencha os momentos de falta de inspiração passando a limpo o que já escreveu. Entretanto, a inspiração despertará.

IX. Nulla dies sine linea - mas semanas sim.

X. Nunca dê uma obra por acabada sem ter mergulhado nela uma vez mais. desde o serão até ao nascer do dia.

XI. Não escreva a conclusão do trabalho no lugar onde habitualmente trabalha. Aí, perderia a coragem de fazê-lo.

XII. Graus de elaboração da obra: pensamento - estilo - escrita. A finalidade de passar a limpo é a de que agora toda a atenção se concentre na caligrafia. O pensamento mata a inspiração, o estilo aprisiona o pensamento, a escrita recompensa o estilo.

XIII. A obra é a máscara mortuária da sua concepção.


Rua de mão única / 

Infância Berlinense, 1900

Editora Autêntica, 2013

p. 27-28


 Jeremy Geddes, Cosmonaut

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